Aquela imagem dos oito
jogadores da U. Leiria a posar para a foto antes de se dar início ao jogo com o
Feirense será difícil de tirar da cabeça de quem se interessa por futebol
durante muitos anos. Dificilmente seria possível encontrar melhor expressão
icónica de que a SAD do Lis tinha batido no fundo naquele mês de Abril de 2012.
Por
essa altura, já Mário Cruz, que fora também administrador ao lado de João
Bartolomeu, mas sairia uns tempos antes, acautelava, pelo menos, o futuro do
clube. Como presidente, não iria deixar que o futebol acabasse na cidade.
Lançou as primeiras sementes do renascimento inscrevendo uma equipa no
distrital, depois de uma assembleia em que os sócios lhe deram o aval.
A SAD,
depois de se ver despromovida à II Liga, também não conseguiu inscrever-se
nesse escalão, e desceu mais um degrau, até ao extinto Campeonato Nacional da
II Divisão. Ainda competiu, de forma sofrível, na última época, enquanto a
formação do clube festejava a subida de divisão logo no primeiro ano de vida.
Uns
continuavam de costas voltadas para a comunidade leiriense, mantendo-se a jogar
em casa emprestada (Santa Catarina da Serra), tal como acontecera na temporada
anterior na Marinha Grande, enquanto os outros jogavam no melhor palco da
região, o Estádio Dr. Magalhães Pessoa. O mesmo que acolhe esta quarta-feira o
Portugal-Camarões.
Reconquistado
o coração dos adeptos, outra frente se abria no horizonte. Perante as
dificuldades da SAD, atolada em dívidas, o tribunal decretou a sua extinção em
Julho de 2013. Era tempo de enterrar a história, feita de vários pontos altos,
como a final da Taça de Portugal de 2003, perdida para o FC Porto, com um golo
de Derlei, que passara pela União, tal como Helton. Para trás ficaram também
algumas participações em provas europeias e, claro, a passagem de Mourinho.
Batalha pelos direitos
desportivos valeu duas subidas
Ficava
em aberto uma vaga no Campeonato Nacional de Seniores (CNS) e Mário Cruz lutou
por conseguir os direitos desportivos da SAD. «Foi determinante, no sentido em
que o nosso objetivo sempre foi recolocar a U. Leiria onde estava, e isto
permitiu-nos encurtar distâncias. De outra forma, estaríamos agora na Divisão
de Honra, e também beneficiámos da extinção da III Divisão Nacional», conta o
agora vice-presidente do clube do Lis.
Em vez
disso, os leirienses estão apenas a um pequeno passo do ingressar na II Liga, o
primeiro escalão profissional, disputando a fase de subida palmo a palmo. Um
absoluto contraste com os primeiros tempos, quando o clube, de um momento para
o outro, voltou a ter futebol sénior… para não o deixar morrer.
«Quando
nos vimos com o menino nos braços, não tínhamos nada. Nem equipamentos, bolas,
nada. Foi preciso começar do zero, renascer das cinzas. Não estávamos
preparados, quer ao nível de estruturas, quer ao nível de matéria-prima»,
recorda o dirigente.
«Mas
com boa vontade e esforço de todos, lá fomos traçando o nosso caminho. O nosso
objetivo era devolver o clube à cidade e aos sócios, e vimos, de facto, que
havia uma grande recetividade e quem prometeu ajudar não faltou à promessa. As
coisas têm corrido melhor que o previsto, foi como um milagre», enaltece.
A alegria de volta nas coisas
simples
No
escalão mais baixo do distrital, a I Divisão, a equipa liderada por Luís Bilro,
antigo jogador e capitão da casa, conseguiu galvanizar os adeptos e rendibilizar
o apoio ao máximo, numa onda que culminou no primeiro lugar do campeonato, sem
derrotas.
«Tínhamos
por vezes mais pessoas a assistir do que quando a equipa estava na I Liga e
íamos a Alvalade ou ao Porto. Passamos a utilizar o estádio municipal porque
entendemos que era a nossa casa e uma forma de congregar mais gente à nossa
volta», conta Mário Cruz.
A
aposta na chamada prata da casa tem sido determinante. Além dos jogadores, os
técnicos são igualmente dos que sentem o verdadeiro amor à camisola. Depois de
Bilro, seguiu-se Rui Nascimento, outro filho da terra, e antigo atleta do
clube, agora a solo depois de uma carreira como adjunto de Manuel Cajuda.
A
câmara, com quem João Bartolomeu não se entendia, também foi dando uma ajuda
«dentro do possível», sublinha o vice-presidente, porque os tempos são difíceis
para todos. Com o salto de dois escalões, tudo ficou mais sério, mas quem
dirige o clube tem o plano delineado há muito tempo.
O
objetivo, regressar ao futebol profissional, se for atingido, vai requerer
outros desafios. Desde logo, a constituição de uma nova sociedade anónima
desportiva ou então uma sociedade desportiva unipessoal por cotas.
«Quando
a questão se colocar, vamos dar cumprimento à lei, como é óbvio. Iremos ouvir
os sócios e tomar a melhor decisão. Queremos algo que salvaguarde a matriz
popular, não queremos repetir o passado recente», promete.
Em
paralelo com o sucesso dos seniores, também as camadas jovens têm dado um bom
exemplo de vivacidade. «Temos algo inédito, que é ter iniciados, juvenis e
juniores na fase de apuramento de campeão, em luta com as maiores equipas do
país em cada escalão», enaltece, sublinhando as mais de 400 pessoas que
utilizam a academia do clube.
Os pecados da SAD, virtudes
do clube
A
saída de cena de João Bartolomeu foi um verdadeiro teste à capacidade de
resistência do futebol em Leiria. Seria possível voltar a erguer os pilares de
outrora? «Havia, de facto, esse receio, mas, neste momento, penso que está
provado que a cidade pode voltar a ter uma equipa na I Liga», arrisca Mário
Cruz.
O
passado ficou marcado por vários erros, que agora urge não repetir. «Ele era a
SAD. Era dono e senhor, punha e dispunha como queria, e foi cavando um fosso
entre si e a sociedade. A SAD nada dizia às pessoas, e vice-versa», sustenta.
Ao
invés, a nova fornada de dirigentes defende que o clube deve ser dos sócios e
de todos os leirienses em geral. «Queremos fazer as coisas de uma forma mais
transparente e sustentável», reforça, ao mesmo tempo que fala de um momento de
estabilidade e condições para desenvolver um projeto a partir de boas bases:
«O
clube está estável e tem uma estrutura sólida. Houve eleições recentemente e
temos um presidente que é uma pessoa séria e empenhada, capaz de dar sequência
ao que já foi feito. Estou plenamente convicto de que, com este elenco, e o
apoio das forças vivas da região, teremos pernas para andar.»
Ano e
meio depois do afastamento do truculento João Bartolomeu, a vida segue
tranquila em Leiria. O clube voltou a sonhar, a ter ambições, e pensa o futuro
com ideias claras e estruturadas. O lema é «Um Novo Fôlego, a Paixão de
Sempre». Eles acreditam.
Francisco Frederico - Mais Futebol
Grande trabalho. Parabéns.
ResponderEliminarPois o que se tem visto é que a ascenção meteórica que o clube está a ter pode revelar-se novamente "fatal" para novo tombo. Espero que me engane e que quem tem lutado para colocar o clube novamente no seu lugar não se deixe levar pela emoção! As palavras cuidadas nas respostas dadas a esta entrevista pode nem sempre significar o que se passa no terreno
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